sábado, 4 de julho de 2009

Brasil cria sua primeira D.O.

Rumo a um novo status

Praticamente concluído, regulamento define Merlot como `ícone' dos tintos da futura Denominação de Origem Vale dos Vinhedos

Por Giovani Capra

Primeira região brasileira a conquistar uma Indicação de Procedência (IP), em 2002, o Vale dos Vinhedos planeja obter brevemente um status ainda superior – o de Denominação de Origem (DO). Confirmada tal ascendência, o Vale, na atual condição uma área reconhecida por sua qualificada produção vinícola, passará a ser uma zona distinta por conta da elaboração de um vinho particular, característico, devido ao meio geográfico, incluídos fatores naturais e humanos. Ou seja, o vinho do Vale dos Vinhedos a exibir o apelo de DO ostentará o atributo de ser um produto singular, que só é feito ali. É algo bastante sutil – mas são só as sutilezas, afinal, que permitem diferenciar entre o que é muito bom daquilo que é excelente...

O regulamento de uso estabelecendo os parâmetros para que se expresse tal peculiaridade está praticamente concluído, relata o coordenador-geral do programa de desenvolvimento de Indicações Geográficas de vinhos e espumantes da Serra Gaúcha, pesquisador da Embrapa Uva e Vinho Jorge Tonietto. O documento, detalha ele, define, entre outros aspectos, os tipos de vinho, respectivas variedades de uva, sistemas de condução e manejo da videira, tecnologias enológicas e normas de rotulagem autorizados para a elaboração do produto que depois exibirá a apelação de Denominação de Origem.

Por exemplo, foram estabelecidas como cultivares principais para produção na DO as castas Merlot, para os tintos, e Chardonnay, para os brancos, por serem as que apresentam melhores características de adaptação e diferenciais de qualidade na vinificação.

Ao lado, confira alguns dos itens do regulamento, elaborado pelo conselho regulador da Associação dos Produtores de Vinhos Finos do Vale dos Vinhedos (Aprovale) e por pesquisadores da Embrapa Uva e Vinho e da Universidade de Caxias do Sul (UCS). O projeto todo do Vale inclui, além destas instituições, Embrapa Clima Temperado e Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), com suporte financeiro da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) e apoio institucional do Instituto Brasileiro do Vinho (Ibravin).No momento, de acordo com Tonietto, trabalha-se no sentido de determinar as normas de controle de qualidade dos produtos e processos. A proposta, nota ele, é garantir o cumprimento das regras do regulamento, assegurando a total rastreabilidade (a possibilidade de descrever a história, desde a origem aos processos aplicados em sua elaboração) dos vinhos.

O pesquisador informa que a intenção é encaminhar no segundo semestre deste ano o pedido de reconhecimento da DO ao órgão que o outorga no Brasil – o Instituto Nacional da Propriedade Industrial (Inpi). Com isso, a expectativa é de que até o final de 2010 o Vale dos Vinhedos passe a ostentar a condição de região com Denominação de Origem.O regulamento de uso para a Denominação de Origem (DO) Vale dos Vinhedos prevê, entre outras regras:

* A distinção estará limitada a três tipos de vinho: espumantes (excluindo-se os moscatéis), tintos e brancos finos;

* Para a elaboração de espumantes, serão três as variedades de uva autorizadas: Chardonnay, Pinot Noir e Riesling Itálico. No rótulo principal, será proibido destacar a eventual variedade predominante – podendo, contudo, o corte ser detalhado no contrarrótulo. "A proposta é evidenciar o conceito `Espumante do Vale dos Vinhedos'", assinala o pesquisador Jorge Tonietto;

* Para a elaboração de vinhos tintos, serão quatro as variedades de uva autorizadas: Merlot, Cabernet Sauvignon, Tannat e Cabernet Franc.

O único varietal permitido será o Merlot – sendo que o vinho deverá ter sido elaborado com, no mínimo, 85% de matéria-prima de tal casta. O percentual, observa Tonietto, foi definido tendo em vista o fato de que se trata do patamar adotado em um dos mercados-alvo do processo pela conquista da DO, a Europa – embora a legislação brasileira preveja que um vinho seja identificado como varietal já quando apresentando 75% de uma cultivar em sua composição. As outras três variedades permitidas pela DO, portanto, só poderão ser usadas em assemblages, com Merlot – que deverá responder por, pelo menos, 60% do corte;

* Para brancos, serão duas as variedades autorizadas: Chardonnay e Riesling Itálico. O único varietal permitido será o Chardonnay – também respondendo por, no mínimo, 85% da composição do vinho.

Como no caso dos tintos, a uva Riesling Itálico só poderá ser utilizada em cortes, com Chardonnay – esta com, igualmente, 60% do assemblage, no mínimo;

* Para qualquer vinho, o uso de madeira será permitido exclusivamente na forma de barricas de carvalho para amadurecimento (ou seja, exclui-se a possibilidade de utilização de chips, maravalha etc.);

* Os vinhos não poderão sofrer chaptalização (a correção da graduação alcoólica, por meio da adição de açúcar);

* O sistema de condução de vinhedos deverá ser, exclusivamente, a espaldeira;

* A produtividade máxima de uva será de 10 toneladas por hectare, para vinhos tintos ou brancos finos; para espumantes, 12;

* A uva deverá ser 100% oriunda da área delimitada do Vale dos Vinhedos, para todas as cultivares autorizadas.

São pelo menos 15 os tópicos particularizando as exigências dos padrões de qualidade de cada produto. Jorge Tonietto ressalta que tais normas serão aplicadas aos produtos detentores do status de Denominação de Origem Vale dos Vinhedos. Ou seja, a conquista da Denominação não significa que não se elaborará mais outros vinhos no Vale, com características diversas quanto a práticas vitícolas, enológicas e comerciais: sua produção não será `proibida', mas, por exemplo, um vinho tranquilo rosé local, pelas regras, não poderá ostentar a distinção de DO.

De outra parte, com a conquista da Denominação de Origem, a Indicação de Procedência Vale dos Vinhedos, passará, na prática, a não mais existir – noutras palavras, será incorporada pelo conceito de DO, mais qualificado e específico, com todas suas modificações.

Fonte: http://www.jornalbonvivant.com.br


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